Mecum sunt divitiae… ut ditem diligentes me, et thesauros eorum repleam – “Comigo estão as riquezas… para enriquecer os que me amam e encher os seus tesouros” (Pv 8, 18 e 21)
Sumário. É próprio das pessoas de coração bem formado o querer fazer todos contentes. Mas onde acharemos quem tenha o coração mais bondoso que Jesus Cristo? Para nos comunicar as suas riquezas chegou a fazer-se homem e pobre como nós. Mais: Ele quis ficar conosco no Santíssimo Sacramento, no qual está sempre com as mãos cheias de graças e convida-nos continuamente, a que nos aproximemos para as receber. Se, pois, ficamos sempre pobres, a culpa é só nossa.
I. É próprio das pessoas de coração bem formado querer fazer todos contentes, especialmente os mais necessitados e aflitos. Mas onde acharemos quem tenha o coração mais bondoso que Jesus Cristo? Por ser a bondade infinita, tem um desejo extremo de nos comunicar as suas riquezas: Mecum sunt divitiae, ut ditem diligentes me – “Comigo estão as riquezas, para enriquecer os que me amam” . Ele se fez pobre, diz o apóstolo, para nos fazer ricos: Propter vos egenus factus est, ut illius inopia vos divites essetis (1) .
Para este fim ainda quis ficar no Santíssimo Sacramento, no qual está com as mãos cheias de graça, conforme se mostrou ao Padre Balthazar Alvarez, afim de dispensá-las aos que vierem visitar. Com o mesmo intuito se nos dá todo inteiro na santa comunhão, dando-nos a entender que não saberá negar os seus bens, a quem dá toda a sua pessoa. Quomodo non etiam cum illo omnia nobis donavit? (2) – “Como não nos deu também com Ele todas as coisas?” – No Coração de Jesus achamos, portanto, todos os bens e todas as graças que desejemos: In omnibus divites facti estis in illo,… ita ut nihil vobis desit in ulla gratia (3) – “Em todas as coisas fostes enriquecidos n’Ele (Cristo),… de modo que nada vos falta em graça alguma” .
Vê, portanto, que é ao Coração de Jesus que devemos agradecer todas as graças recebidas: a Redenção, a vocação, as luzes interiores, o perdão, a força para resistir às tentações, a paciência nas contrariedades; pois que, sem o seu auxílio nenhum bem poderíamos fazer: Sine me nihil potestis facere (4) – “Sem mim não podeis fazer nada” . E se no passado, diz o Senhor, não tendes recebido graças mais abundantes, não vos queixeis de mim; queixai-vos de vós mesmos, porque tendes descuidado de m’as pedir. Usque modo non petistis quidquam; petite et accipietis (5) – “Até agora não tendes pedido nada: pedi e recebereis”.
II. Oh! Quanto é rico, quanto é liberal o Coração de Jesus, para com os que a Ele recorrem! Oh, quão grandes graças recebem as almas que cuidam em pedir auxílio a Jesus Cristo! Davi dizia: Tu, Domine, suavis et mitis, et multae misericordiae omnibus invocantibus te (6) – “Tu, ó Senhor, és suave e brando e de muita misericórdia para todos os que te invocam” . Recorramos, portanto, sempre a este coração, peçamos com confiança e obteremos tudo.
Ah, meu Jesus, Vós não Vos dedignastes de sacrificar por mim vosso sangue e a vida, e eu me recusarei a dar-Vos o meu miserável coração? Eu Vo-lo dou todo inteiro, meu amado Redentor, eu Vos dou toda a minha vontade; aceitai-a e disponde dela segundo o vosso agrado. Não tenho nem posso nada; mas disponho de um coração que Vós me destes e que ninguém me pode roubar; podem tirar-me os bens, o sangue, a vida, mas não o coração. Com este coração Vos posso amar e Vos quero amar. Ensinai-me, ó meu Deus, o perfeito esquecimento de mim mesmo; ensinai-me o que deva fazer para obter o vosso puro amor, cujo desejo Vós mesmo me inspirastes pela vossa infinita bondade. Minha alma está resolvida a Vos agradar; mas de Vós espero e peço a graça de o fazer.
Ó Coração amantíssimo de Jesus, Vós deveis fazer que seja todo vosso o meu pobre coração, que no passado Vos tem sido tão ingrato e pela sua culpa privado do vosso amor. Suplico-Vos que meu coração seja todo amor por Vós, assim como o vosso é todo amor por mim. Fazei com que a minha vontade seja toda unida à vossa, de modo que eu não queira senão o que Vós quereis. A vossa santa vontade seja doravante a regra de todas as minhas ações, de todos os meus pensamentos e de todos os meus desejos.
Espero, ó Senhor, que não me negareis a vossa graça para executar a resolução que, prostrado a vossos pés, tomo hoje, a de aceitar com resignação tudo que queirais dispor de mim, e do que é meu, tanto na vida como na morte.
– Ó Maria Imaculada, fostes feliz por terdes sempre vosso Coração conformado em tudo ao Coração de Jesus. – Por piedade, minha Mãe, obtende-me que para o futuro eu não queira nem deseje senão o que queirais vós e Jesus.
Referências:
(1) 2 Cor 8, 9 (2) Rm 8, 32 (3) 1 Cor 1, 5 e 7 (4) Jo 15, 5 (5) Jo 16, 24 (6) Sl 85, 5
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 165-167)